Exposição 'Mulheres de Fibra' reúne artesãs de São Sebastião da Boa Vista

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Coletivo de artesãs Arte em Fibra de Jupati. Foto: Moysés Cavalcante 

Com a fibra do jupati, extraída de palmeira característica do Norte, as artesãs do Grupo Arte em Fibra de Jupati trançam o seu destino. Toda a beleza do tradicional trabalho das artesãs marajoaras de São Sebastião da Boa Vista poderá ser conferido, a partir da próxima quinta-feira (26), na área expositiva do Espaço São José Liberto/Polo Joalheiro do Pará. A exposição “Mulheres de Fibra” reúne bolsas, brincos, colares, tiaras, broches, braceletes e outros acessórios que revelam a sutileza do trançado com a fibra, prática repassada entre as mulheres da família. Aberta ao público no local até domingo (29), a mostra pode ser visitada no horário de funcionamento do espaço: de terça a sábado, das 9h às 18h30, e aos domingos e feriados, das 10h às 18h.
Foi por meio de um projeto apoiado pelo Ministério da Cultura (MinC), denominado "Mulheres da fibra: tecendo a vida com arte", que o grupo produziu uma coleção exclusiva de acessórios de moda a partir da fibra do jupati, retirada do Jupatizeiro. Da palmeira também é extraída a tala, matéria-prima do matapi (instrumento artesanal de captura de camarões), do abajur e de outros produtos.

A exposição tem a parceria do Governo do Pará, por meio da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia (Sedeme) e do Instituto de Gemas e Joias da Amazônia (Igama), que gerencia o Espaço São José Liberto e o Programa Polo Joalheiro do Pará.
O projeto do MinC visa dar visibilidade e oportunidade de mercado a essas mulheres artesãs. Como resultado final, além da exposição, também será lançado um site, como forma de contar ao ao mundo a história dessa tradição marajoara. No espaço virtual poder O espaço virtual mostrará produtos artesanais repletos de informações e estéticas do cotidiano dessas mulheres ribeirinhas, bem como o processo produtivo e criativo do grupo, expondo peças de moda e decoração que serão comercializadas.

A arquiteta Terezinha Abrahim assina o projeto arquitetônico da exposição, pensado de forma a transportar o público para o ambiente amazônico, onde rios, furos, vegetação de várzea, palmeiras, barcos e o colorido das casas de madeira compõem o cenário da vida local. O município de São Sebastião da Boa Vista tem cerca de 30 mil habitantes e é considerado a Veneza do Marajó, com ruas sobre palafitas e onde quase toda a população vive sob as águas.
Com esse clima serão feitas, na mostra, referências às etapas do processo de manipulação da matéria-prima. A fibra será mostrada desde o estado bruto até chegar na forma do produto final. Os visitantes poderão ver a haste do jupati in natura e a fibra (em estado bruto e já colorida), no contexto das peças expostas. Alguns produtos de jupati já são vendidos na Casa do Artesão, que reúne tipologias artesanais de todas as regiões do Pará. As cores, leveza e formas que a fibra pode tomar chamam a atenção para a criatividade das artesãs.

Modelo Sarah Jardim usa a fibra do jupati. A locação é o Pirarara, Marajó.
Make e stilyst de Amanda Pris. Foto: Geraldo Menezes


Tradição - Segundo a cultura local, aos homens é destinada a tarefa de coletar o jupati, de onde é separada a tala e a fibra. Gabriel Costa Martins, 19, é estudante e filho de artesã. Ele coleta o jupati desde os 12 ou 13 anos, ajudando no trabalho da família. “De vez em quando a gente cai, mas com a experiência do pai, que nos ensina, a gente consegue. Não demora muito 'pra' tirar. Chegando na árvore, que não é muito alta, a gente sobe, corta e recolhe”, relata.
Artesã Marly Naum. Foto: Moysés Cavalcante
Marly do Socorro Naum, 47, trabalha junto com a filha, Marlene Naum Costa. Ambas moram no Furo Pirarara e integram o coletivo de artesãs. Elas têm boas expectativas em relação à expansão do trabalho que desenvolvem. “Estou confiante que vai ser um sucesso. A gente está fazendo novas peças e acho que vai vender bem depois da exposição. Acredito que o pessoal vai gostar mais do nosso trabalho”, diz Marly.
Ela conta que pela manhã, bem cedo, é o melhor horário para trançar. Algumas vezes, segundo Marly, o trabalho é feito à tarde. “Quando está quente não fica bom. Tem que estar em um clima legal porque senão a fibra fica “quebrenta”. Quebra tudinho”, explica, contando que o calor resseca a fibra, a qual  precisa ser umedecida durante o processo.
Amélia Martins da Silva, 74 anos, uma das precursoras do fazer artesanal do trançado de fibra de jupati, conta que seguiu os passos da mãe e, principalmente, de uma cunhada, para depois, de forma autodidata, “tirar os desenhos na fibra” (trançar). “Eu via como a minha cunhada trabalhava e ia fazendo. A minha mãe teceu pouco porque trabalhava no roçado. Eu tinha, mais ou menos, uns 13 anos quando comecei fazendo o chapéu de praia. Também ‘tirava’ os nomes na garrafinha. Fui aprendendo por mim mesma e, como eu estudava, sabia qual era a letra e já ia fazendo. Só não me dei com esse chapéu ‘pechetito’ (pequenino) de bonequinha”, relembra.  
A prática é tão antiga que a artesã não tem conhecimento de sua autoria. “A minha mãe começou com a mãe dela, que também aprendeu com a mãe e assim por diante. É de família, muito antigo. Era o trabalho que as mulheres faziam”, diz Amélia, que se aposentou com 55 anos e parou de trançar devido a problemas de vista.
Amélia fala da esperança de ver o artesanato mais valorizado. “Era uma grande luta. Parei quando me aposentei. Mas agora eu estou achando bom e tenho esperança que melhore para elas, que estão trabalhando e têm uma ajuda. Tem sempre aquela esperança boa. Se fosse no tempo que eu trabalhava também ia ficar feliz porque eu ia ter uma garantia boa pra mim”.
Bolsa destaca o trançado da fibra de jupati.
Foto: Simone Moura
Mulheres de fibra -  Com o incentivo federal, o registro iconográfico do trançado, o levantamento do quantitativo de artesãs e a qualificação técnica para a melhoria dos produtos, através da inserção do design, têm levado o grupo a alçar voos que antes eram apenas sonhos para essas artesãs cheias de fibra. As mulheres dividem o trançado do jupati com as tarefas domésticas e a pesca artesanal, atividade prioritária de geração de renda das famílias do município de São Sebastião, também conhecido pela produção de açaí e camarão.
Por meio de capacitação de gestão da comercialização dos produtos, através do site, as artesãs poderão expandir esse universo produtivo. O evento de lançamento do sítio na web com exposição e comercialização das peças na cidade de Belém será um verdadeiro marco para o trabalho do Grupo Arte em Fibra de Jupati, criado em 2012 e composto por gerações diferentes de mulheres.
Fazem parte do grupo as artesãs Rosabeth Martins Costa, Rosa Maria Ferreira, Marly do Socorro Naum, Marlene Naum Costa, Maria Gorete Martins, Marisa Rocha, Marília Rocha, Renata Costa, Liliene Veiga, Raylana Costa, Érica Cunha Soares e a proponente do projeto, Maria do Socorro. Os produtos na nova coleção têm design de Ninon Jardim, Lídia Abrahim, Manoela Costa e Nilma Arraes.
De acordo com a designer Ninon Jardim, todas as artesãs são mulheres de fibra, pois vivem à margem dos rios e, mesmo silenciadas - como apresenta Maria Antonieta Antonacci em prefácio ao livro À margem dos “Marajós”: cotidiano, memórias e imagens da “Cidade-Floresta”, Melgaço–PA (2006), de autoria do historiador Agenor Sarraf Pacheco – resistem, reinventam formas de sobrevivência e continuam pulsando, longe ou perto de nossa atenção e de nosso chão familiar.

“Continuam, por gerações, (re)construindo-se, (res)significando-se e (re)afirmando-se pela arte em fibra do jupati, situadas em furos e rios de São Sebastião da Boa Vista, no Marajó das Florestas. São mulheres de fibra e da fibra, que está entranhada em seu cotidiano, como expressão estética, possibilidade de vivência, saber importante às outras gerações, prazer, momento de encontros e movimento da memória”, completa Ninon.
As modelos usam acessórios de moda criados com a fibra do jupati.
Foto: Geraldo Menezes 
Serviço: Exposição “Mulheres de Fibra”, do Grupo Arte em Fibra de Jupati. Abertura na quinta-feira (26), às 18h, no Espaço São José Liberto/ Polo Joalheiro do Pará (Praça Amazonas, s/n, Jurunas, Belém). A mostra fica aberta ao público até domingo (29), no horário de funcionamento do espaço, de terça a sábado, das 9h às 18h30, e aos domingos e feriados, das 10h às 18h. Entrada franca.
Informações:
Contato do Grupo Arte em Fibra de Jupati:
Telefone: (91) 99287-3858
Facebook: https://www.facebook.com/artefibrajupati/?fref=ts
Instagram: @artefibrajupati
Luciane Fiuza
São José Liberto

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